Dicas básicas para desenhistas que desejam vender
seu trabalho fora do Brasil, sem sair do Brasil.
Como já comentamos na matéria sobre a dupla Eudetenis neste link, existe em nosso país um forte descaso com os desenhistas,
porque se convencionou a estúpida ideia que desenhar "é coisa de
criança", e se alguém trabalha com isso, é retardado ou um adulto que não
cresceu. Quantas vezes se viu na face das pessoas aquela expressão mista de
nojo, desprezo e pena ao dizer: "sou um desenhista". E por conta
desse ostracismo social, os desenhistas são tratados quase como uma sub-raça, e
por efeito, explorados descaradamente. Porque afinal de contas, na cabeça desse
povo bitolado, "desenhar é fácil", então sempre querem pagar uma
mixaria - quando pagam - por ilustrações, criações de mascotes ou até
logomarcas (que sim, é um tipo de desenho). Não esqueçamos aqueles que pedem um
desenho de graça, pois
afinal, desenhar é brincadeira, né? E se o desenhista tenta cobrar o preço que
vale por seu trabalho, geralmente ouve: "o quê, tudo isso por um
desenho?" Acrescente a isso o fato que alguns desenhistas novatos vendem
seus serviços bem baratinho - ou até gratuitamente - para "pegar fama". E
se para as pessoas que tem os empregos considerados "comuns" em
escritórios, lojas e fábricas a situação econômica do país não ajuda, imagine o
quanto sofrem os desenhistas. Raramente se encontra no Brasil empresas
dispostas a pagar o preço justo por uma ilustração. Estamos em um país
realmente difícil para quem deseja seguir a sofrida profissão de desenhar.
Perdeu-se a conta de quantos jovens talentosos desistiram da carreira logo no início,
por todos esses preconceitos e explorações que descrevemos acima. Realmente, é
um cenário que desanima os menos motivados. Só abraça a profissão de desenhar
quem tem uma paixão profunda pelo que faz, aliada a uma persistência feroz.
Sim, no Brasil, desenhar é para os fortes.
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Todas as ilustrações desta matéria foram gentilmente cedidas por Eudetenis. Nossos sinceros agradecimentos. |
Mas apesar das poucas oportunidades e muito preconceito, existe
uma solução capaz de ajudar desenhistas - mesmo os iniciantes - a ganhar um bom
dinheiro, se estiver disposto a desenhar tanto quanto um empregado de qualquer
empresa trabalha. Esta solução está ao alcance de qualquer computador com
internet, e se chama commission.
E o que é isso? A tradução do inglês significa "comissão" - mas ela
não deve ser entendida como a porcentagem que um vendedor lucrou ao vender
algo, como se convencionou usá-la por aqui. Outro uso menos conhecido para "comissão" é quando se tem um serviço designado ou encomendado por
alguém. É neste sentido que commisson deve
ser entendida: a encomenda de um serviço ou, em nosso assunto específico, de
uma ilustração, por pessoas espalhadas pelo mundo
que a-do-ram desenhos. E acredite, existem muito mais gente disposta a pagar
por uma ilustração do que se imagina. Mas como funciona esse sistema? Já chegamos lá.
Antes de explicar como funciona, precisamos deixar claro o que
é ou não commission. Em primeiro lugar, cobra-se por esse tipo de desenho bem
mais barato do que se cobraria para uma empresa, por um motivo simples: a
pessoa que encomenda esse serviço está fazendo-a para uso particular, para
guardar para si e não pretende usá-lo
para ganhar dinheiro, seja estampando o desenho numa camiseta para revender
ou numa caneca, por exemplo. No momento que uma ilustração/desenho será
utilizada para fins comerciais/propaganda/divulgação, a tabela de preços muda. Commission é uma ilustração encomendada por uma pessoa que quer algo exclusivo e
único para guardar consigo, nada mais. Qualquer forma de uso
financeiro/comercial de uma commission,
mesmo anos depois de desenhada e entregue, precisa ser renegociado e pago ao
desenhista que criou. Pois de acordo com as leis de direito autoral
internacional, a criação/desenho feita por um artista é ainda propriedade dele
(mesmo quando assina um contrato de exclusividade da imagem para uma
determinada empresa), e qualquer uso sem autorização por escrito é ilegal e passível
de processo. Portanto, se tem algum espertinho lendo essa matéria e achando que
pode encomendar malandramente uma commission por ser mais barata, e depois usá-la para
faturar/divulgar, já fica o aviso: você será processado. E vai perder. E vai
ter que pagar. Então, seja honesto e faça tudo corretamente, para não ter uma longa
dor de cabeça. Tendo ficado claro nosso alerta, vamos ver como funciona o
sistema de commissions.
Um jornalista muito famoso e já falecido, chamado Paulo Francis, disse ao ver o
crescimento monstruoso da internet nos 5 primeiros anos da década de 1990 (cito
de cabeça): "a internet vai colocar na marra o Brasil no primeiro mundo”.
Hoje sabemos que ele estava parcialmente certo, mas no que se refere aos nossos
mais talentosos e ferrenhos desenhistas, essa profecia se tornou uma grande
verdade. Graças a internet,
qualquer desenhista brasileiro esforçado pode ganhar um bom dinheiro desenhando
para pessoas em qualquer parte do mundo. Para começar a trabalhar com commissions, é preciso criar sua própria
página na internet. Ela pode ser feita nos vários sites especializados e
gratuitos como o Deviantart neste link ou o Pixiv neste link, ou
ainda uma página própria no Facebook (já existem milhares delas feitas por
desenhistas brasileiros que se divulgam). Existem muitas outras como a Tumblr neste link, a Artstation neste link, os blogs e, se o artista quer investir um pouco, abrir um site com
domínio próprio tipo www.nomedoartista.com.br
.
As oportunidades e espaços gratuitos, como pode-se ver, são
muitos, e qualquer pessoa pode usar um ou vários, se tiver tempo e vontade para
cuidar deles. Mas em todos, a regra é a mesma: poste o máximo e o melhor das suas ilustrações, e divulgue seus
espaços – mas divulgue muito! Uma forma de se divulgar é trocando links com
outros desenhistas ou em comunidades no Facebook (com a devida
autorização dos moderadores, senão é SPAM – propaganda chata e mal vinda). É
necessário também um domínio básico do inglês, principalmente se for usar Deviantart, Pixiv,
Tumblr ou Artstation. Porque, infelizmente,
no Brasil poucas pessoas estão dispostas a pagar por uma commission – tanto pelos preconceitos que explicamos acima, como
por falta de grana mesmo... Portanto, para atrair o público mais interessado (e
abonado), o caminho é montar sua(s) página(s) em um ou em vários
destes sites internacionais dedicados a divulgação de artistas que já indicamos,
e postar todo o texto em inglês. Caso
não entenda muito de inglês, peça a algum conhecido para ajudar ou use o Google Tradutor disponível neste link – mas já saiba que ele não é lá muito é confiável... Montada(s) sua(s) página(s) e feita a divulgação, é esperar
pelos primeiros contatos e negociar o valor de suas commissions.

E quanto
cobrar? Como negociar? E prazo de entrega? Isso tudo quem define é o artista. O
valor pode ser desde dez dólares por um desenho simples em preto e branco até
as centenas de dólares por uma ilustração ultra complexa e colorida. Quanto
mais detalhes o cliente pedir, mais caro fica. Mas sempre deixe espaço para
negociação, porque como numa feira, podem “chorar” desconto, então ser flexível
também faz parte do jogo. E cada desenhista tem sua velocidade para desenhar –
alguns são mais lentos, outros são mais rápidos – portanto, cada um tem seu
prazo de entrega. Mas se der um prazo, trate de cumpri-lo para não se queimar
com sua clientela. Lembre-se que diferente do Brasil, a pontualidade é muito
importante nos países do Primeiro Mundo. Para facilitar aos interessados em
tentar vender commissions, vamos usar como exemplo uma dupla de Natal
- RN que tem anos de estrada nessa forma de trabalho: Paulo e Giovana Serafim
(apelido carinhoso de “Gigi”), mais conhecidos como Eudetenis.
Além de seus trabalhos para os Emirados
Árabes e para empresas de videogames no Japão, Eudetenis separa três dias por semana para “vender” commissions –
ou melhor, atender os pedidos. Já estão a seis anos trabalhando com isso, então possuem
uma carteira de clientes estrangeiros grande e fiel. E como é uma das poucas
desenhistas brasileiras que desenha mangá tão bem quanto os japoneses, ao longo
dos anos Gigi conquistou centenas de admiradores ao redor do mundo incluindo
EUA, Europa e oriente (sim, Japão incluso). As encomendas chegam de todas as partes via internet,
mas a dupla já sabe seu ritmo de trabalho e desenha de seis a oito ilustrações
por dia, dependendo do que o cliente deseja. E quanto se cobra? De vinte a trezentos
dólares por ilustração/página de quadrinho – afinal, desenhos mais
complexos/coloridos demoram mais e obviamente, são mais caros. A tabela de
preços do Eudetenis está disponível em
inglês e em dólar neste link. Nós consideramos esta uma das tabelas mais completas
e detalhadas disponíveis – ideal para servir de base a quem não tem ideia de
como montar a sua. Mas convém lembrar que os preços do Eudetenis são os preços do Eudetenis.
Cada artista deve vender seu trabalho pelo valor que acha justo!
Quanto a prazos de entrega do Eudetenis, eles variam de uma semana até
um mês – dependendo da complexidade do desenho. E os pagamentos SEMPRE são depositados
antes da entrega da commission. É a
única forma de evitar calotes que, infelizmente, também podem acontecer quando
se negocia com estrangeiros. E qual tipo de desenho/ilustração os clientes/fãs do Eudetenis encomendam? De
tudo, desde histórias em quadrinhos completas até ilustrações ultra detalhadas
– mas o carro-chefe são as ilustrações eróticas, em especial sadomasoquismo. E desenhar
erotismo incomoda Gigi? De forma alguma, pois ela encara esses desenhos pelo
que realmente são: trabalhos encomendados e pagos por uma clientela de gosto
específico. Afinal, o dinheiro deles é tão bom quanto qualquer outro, e se
estão satisfeitos, voltam encomendando outros. Há desenhistas que
por razões morais ou religiosas não aceitam desenhar erotismo, e nada de errado
existe nisso, cada um tem suas regras de vida. Mas fica o alerta que quando se
entra no mundo das commissions, é bom deixar avisado em sua página caso exista
algum tipo de desenho/ilustração que não deseje fazer.
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Sim, coisas MUITO esquisitas são pedidas em commissions... |
E para reforçar a nossa dica de como é importante ter vários espaços diferentes para se divulgar na internet, vejam só todos os endereços virtuais do Eudetenis:
Site pessoal com tabela de preços (para comissions)
http://www.eudetenis.com/br/
Quadrinhos autorais
https://tapastic.com/EUDETENIS
Pixiv
http://www.pixiv.net/member.php?id=2933491
Livestream (assine e acompanhe a Gigi desenhando ao vivo, com direito a participação no chat com as centenas de fãs que ela tem ao redor do mundo)
https://picarto.tv/eudetenis
Deviantart
http://comicamanager.deviantart.com/
Youtube com Speed Paints (desenhos sendo feitos com aceleração do vídeo):
https://www.youtube.com/channel/UCT4o2WKR2BwUG9WOUKBf68w
E encerramos por aqui. Com estas dicas básicas, qualquer
desenhista de qualquer estilo pode ir a luta por uns trocados. Ainda faltou
falarmos de temas mais avançados como as daily
commissions que ajudam a estimular as pessoas a encomendarem mais, e outras
formas de interagir com os clientes para conseguir montar uma fanbase fiel e
consumista. E principalmente, como receber os pagamentos (Paypal e outros). Fica para uma segunda parte desta matéria. Não se preocupe, que ela virá em breve.
No Brasil, temos centenas de desenhista de nível
internacional, infelizmente desconhecidos/ignorados por aqui. Mas eles
conseguem sobreviver graças ao reconhecimento que alcançaram fora do Brasil via
internet, onde não faltam fãs sinceros e livres de mimimi que estão dispostos a
pagar o valor justo pelos desenhos que eles fazem. Quando será que teremos uma
população com mais maturidade para entender que desenhar é uma profissão como qualquer outra?