Antes de ler essa matéria, considere apoiar a Anime EX, a única revista digital sobre anime & mangá do Brasil. São apenas R$ 10,00 por mês para receber uma nova edição toda semana.
Dicas básicas para desenhistas que desejam vender
seu trabalho fora do Brasil, sem sair do Brasil.
Como já comentamos na matéria sobre a dupla Eudetenis neste link, existe em nosso país um forte descaso com os desenhistas,
porque se convencionou a estúpida ideia que desenhar "é coisa de
criança", e se alguém trabalha com isso, é retardado ou um adulto que não
cresceu. Quantas vezes se viu na face das pessoas aquela expressão mista de
nojo, desprezo e pena ao dizer: "sou um desenhista". E por conta
desse ostracismo social, os desenhistas são tratados quase como uma sub-raça, e
por efeito, explorados descaradamente. Porque afinal de contas, na cabeça desse
povo bitolado, "desenhar é fácil", então sempre querem pagar uma
mixaria - quando pagam - por ilustrações, criações de mascotes ou até
logomarcas (que sim, é um tipo de desenho). Não esqueçamos aqueles que pedem um
desenho de graça, pois
afinal, desenhar é brincadeira, né? E se o desenhista tenta cobrar o preço que
vale por seu trabalho, geralmente ouve: "o quê, tudo isso por um
desenho?" Acrescente a isso o fato que alguns desenhistas novatos vendem
seus serviços bem baratinho - ou até gratuitamente - para "pegar fama". E
se para as pessoas que tem os empregos considerados "comuns" em
escritórios, lojas e fábricas a situação econômica do país não ajuda, imagine o
quanto sofrem os desenhistas. Raramente se encontra no Brasil empresas
dispostas a pagar o preço justo por uma ilustração. Estamos em um país
realmente difícil para quem deseja seguir a sofrida profissão de desenhar.
Perdeu-se a conta de quantos jovens talentosos desistiram da carreira logo no início,
por todos esses preconceitos e explorações que descrevemos acima. Realmente, é
um cenário que desanima os menos motivados. Só abraça a profissão de desenhar
quem tem uma paixão profunda pelo que faz, aliada a uma persistência feroz.
Sim, no Brasil, desenhar é para os fortes.
|
Todas as ilustrações desta matéria foram gentilmente cedidas por Eudetenis. Nossos sinceros agradecimentos. |
Mas apesar das poucas oportunidades e muito preconceito, existe
uma solução capaz de ajudar desenhistas - mesmo os iniciantes - a ganhar um bom
dinheiro, se estiver disposto a desenhar tanto quanto um empregado de qualquer
empresa trabalha. Esta solução está ao alcance de qualquer computador com
internet, e se chama commission.
E o que é isso? A tradução do inglês significa "comissão" - mas ela
não deve ser entendida como a porcentagem que um vendedor lucrou ao vender
algo, como se convencionou usá-la por aqui. Outro uso menos conhecido para "comissão" é quando se tem um serviço designado ou encomendado por
alguém. É neste sentido que commisson deve
ser entendida: a encomenda de um serviço ou, em nosso assunto específico, de
uma ilustração, por pessoas espalhadas pelo mundo
que a-do-ram desenhos. E acredite, existem muito mais gente disposta a pagar
por uma ilustração do que se imagina. Mas como funciona esse sistema? Já chegamos lá.
Antes de explicar como funciona, precisamos deixar claro o que
é ou não commission. Em primeiro lugar, cobra-se por esse tipo de desenho bem
mais barato do que se cobraria para uma empresa, por um motivo simples: a
pessoa que encomenda esse serviço está fazendo-a para uso particular, para
guardar para si e não pretende usá-lo
para ganhar dinheiro, seja estampando o desenho numa camiseta para revender
ou numa caneca, por exemplo. No momento que uma ilustração/desenho será
utilizada para fins comerciais/propaganda/divulgação, a tabela de preços muda. Commission é uma ilustração encomendada por uma pessoa que quer algo exclusivo e
único para guardar consigo, nada mais. Qualquer forma de uso
financeiro/comercial de uma commission,
mesmo anos depois de desenhada e entregue, precisa ser renegociado e pago ao
desenhista que criou. Pois de acordo com as leis de direito autoral
internacional, a criação/desenho feita por um artista é ainda propriedade dele
(mesmo quando assina um contrato de exclusividade da imagem para uma
determinada empresa), e qualquer uso sem autorização por escrito é ilegal e passível
de processo. Portanto, se tem algum espertinho lendo essa matéria e achando que
pode encomendar malandramente uma commission por ser mais barata, e depois usá-la para
faturar/divulgar, já fica o aviso: você será processado. E vai perder. E vai
ter que pagar. Então, seja honesto e faça tudo corretamente, para não ter uma longa
dor de cabeça. Tendo ficado claro nosso alerta, vamos ver como funciona o
sistema de commissions.
Um jornalista muito famoso e já falecido, chamado Paulo Francis, disse ao ver o
crescimento monstruoso da internet nos 5 primeiros anos da década de 1990 (cito
de cabeça): "a internet vai colocar na marra o Brasil no primeiro mundo”.
Hoje sabemos que ele estava parcialmente certo, mas no que se refere aos nossos
mais talentosos e ferrenhos desenhistas, essa profecia se tornou uma grande
verdade. Graças a internet,
qualquer desenhista brasileiro esforçado pode ganhar um bom dinheiro desenhando
para pessoas em qualquer parte do mundo. Para começar a trabalhar com commissions, é preciso criar sua própria
página na internet. Ela pode ser feita nos vários sites especializados e
gratuitos como o Deviantart neste link ou o Pixiv neste link, ou
ainda uma página própria no Facebook (já existem milhares delas feitas por
desenhistas brasileiros que se divulgam). Existem muitas outras como a Tumblr neste link, a Artstation neste link, os blogs e, se o artista quer investir um pouco, abrir um site com
domínio próprio tipo www.nomedoartista.com.br
.
As oportunidades e espaços gratuitos, como pode-se ver, são
muitos, e qualquer pessoa pode usar um ou vários, se tiver tempo e vontade para
cuidar deles. Mas em todos, a regra é a mesma: poste o máximo e o melhor das suas ilustrações, e divulgue seus
espaços – mas divulgue muito! Uma forma de se divulgar é trocando links com
outros desenhistas ou em comunidades no Facebook (com a devida
autorização dos moderadores, senão é SPAM – propaganda chata e mal vinda). É
necessário também um domínio básico do inglês, principalmente se for usar Deviantart, Pixiv,
Tumblr ou Artstation. Porque, infelizmente,
no Brasil poucas pessoas estão dispostas a pagar por uma commission – tanto pelos preconceitos que explicamos acima, como
por falta de grana mesmo... Portanto, para atrair o público mais interessado (e
abonado), o caminho é montar sua(s) página(s) em um ou em vários
destes sites internacionais dedicados a divulgação de artistas que já indicamos,
e postar todo o texto em inglês. Caso
não entenda muito de inglês, peça a algum conhecido para ajudar ou use o Google Tradutor disponível neste link – mas já saiba que ele não é lá muito é confiável... Montada(s) sua(s) página(s) e feita a divulgação, é esperar
pelos primeiros contatos e negociar o valor de suas commissions.
E quanto
cobrar? Como negociar? E prazo de entrega? Isso tudo quem define é o artista. O
valor pode ser desde dez dólares por um desenho simples em preto e branco até
as centenas de dólares por uma ilustração ultra complexa e colorida. Quanto
mais detalhes o cliente pedir, mais caro fica. Mas sempre deixe espaço para
negociação, porque como numa feira, podem “chorar” desconto, então ser flexível
também faz parte do jogo. E cada desenhista tem sua velocidade para desenhar –
alguns são mais lentos, outros são mais rápidos – portanto, cada um tem seu
prazo de entrega. Mas se der um prazo, trate de cumpri-lo para não se queimar
com sua clientela. Lembre-se que diferente do Brasil, a pontualidade é muito
importante nos países do Primeiro Mundo. Para facilitar aos interessados em
tentar vender commissions, vamos usar como exemplo uma dupla de Natal
- RN que tem anos de estrada nessa forma de trabalho: Paulo e Giovana Serafim
(apelido carinhoso de “Gigi”), mais conhecidos como Eudetenis.
Além de seus trabalhos para os Emirados
Árabes e para empresas de videogames no Japão, Eudetenis separa três dias por semana para “vender” commissions –
ou melhor, atender os pedidos. Já estão a seis anos trabalhando com isso, então possuem
uma carteira de clientes estrangeiros grande e fiel. E como é uma das poucas
desenhistas brasileiras que desenha mangá tão bem quanto os japoneses, ao longo
dos anos Gigi conquistou centenas de admiradores ao redor do mundo incluindo
EUA, Europa e oriente (sim, Japão incluso). As encomendas chegam de todas as partes via internet,
mas a dupla já sabe seu ritmo de trabalho e desenha de seis a oito ilustrações
por dia, dependendo do que o cliente deseja. E quanto se cobra? De vinte a trezentos
dólares por ilustração/página de quadrinho – afinal, desenhos mais
complexos/coloridos demoram mais e obviamente, são mais caros. A tabela de
preços do Eudetenis está disponível em
inglês e em dólar neste link. Nós consideramos esta uma das tabelas mais completas
e detalhadas disponíveis – ideal para servir de base a quem não tem ideia de
como montar a sua. Mas convém lembrar que os preços do Eudetenis são os preços do Eudetenis.
Cada artista deve vender seu trabalho pelo valor que acha justo!
Quanto a prazos de entrega do Eudetenis, eles variam de uma semana até
um mês – dependendo da complexidade do desenho. E os pagamentos SEMPRE são depositados
antes da entrega da commission. É a
única forma de evitar calotes que, infelizmente, também podem acontecer quando
se negocia com estrangeiros. E qual tipo de desenho/ilustração os clientes/fãs do Eudetenis encomendam? De
tudo, desde histórias em quadrinhos completas até ilustrações ultra detalhadas
– mas o carro-chefe são as ilustrações eróticas, em especial sadomasoquismo. E desenhar
erotismo incomoda Gigi? De forma alguma, pois ela encara esses desenhos pelo
que realmente são: trabalhos encomendados e pagos por uma clientela de gosto
específico. Afinal, o dinheiro deles é tão bom quanto qualquer outro, e se
estão satisfeitos, voltam encomendando outros. Há desenhistas que
por razões morais ou religiosas não aceitam desenhar erotismo, e nada de errado
existe nisso, cada um tem suas regras de vida. Mas fica o alerta que quando se
entra no mundo das commissions, é bom deixar avisado em sua página caso exista
algum tipo de desenho/ilustração que não deseje fazer.
|
Sim, coisas MUITO esquisitas são pedidas em commissions... |
E para reforçar a nossa dica de como é importante ter vários espaços diferentes para se divulgar na internet, vejam só todos os endereços virtuais do Eudetenis:
Site pessoal com tabela de preços (para comissions)
http://www.eudetenis.com/br/
Quadrinhos autorais
https://tapastic.com/EUDETENIS
Pixiv
http://www.pixiv.net/member.php?id=2933491
Livestream (assine e acompanhe a Gigi desenhando ao vivo, com direito a participação no chat com as centenas de fãs que ela tem ao redor do mundo)
https://picarto.tv/eudetenis
Deviantart
http://comicamanager.deviantart.com/
Youtube com Speed Paints (desenhos sendo feitos com aceleração do vídeo):
https://www.youtube.com/channel/UCT4o2WKR2BwUG9WOUKBf68w
E encerramos por aqui. Com estas dicas básicas, qualquer
desenhista de qualquer estilo pode ir a luta por uns trocados. Ainda faltou
falarmos de temas mais avançados como as daily
commissions que ajudam a estimular as pessoas a encomendarem mais, e outras
formas de interagir com os clientes para conseguir montar uma fanbase fiel e
consumista. E principalmente, como receber os pagamentos (Paypal e outros). Fica para uma segunda parte desta matéria. Não se preocupe, que ela virá em breve.
No Brasil, temos centenas de desenhista de nível
internacional, infelizmente desconhecidos/ignorados por aqui. Mas eles
conseguem sobreviver graças ao reconhecimento que alcançaram fora do Brasil via
internet, onde não faltam fãs sinceros e livres de mimimi que estão dispostos a
pagar o valor justo pelos desenhos que eles fazem. Quando será que teremos uma
população com mais maturidade para entender que desenhar é uma profissão como qualquer outra?